sábado, 28 de abril de 2012

Síndrome

“no meio do caminho tinha uma pedra” Carlos Drummond de Andrade

Uma soma de respostas físicas e mentais explodia junto à voz estridente do chefe, palavrões atravessavam-lhe cada um de seus princípios.

Com a alma espremida numa jaula de obrigatoriedades, engoliu  aquele tempo seco, mascarando que o suficiente fosse deixar de sorrir ao restante do dia. Odiou os grampos, as teclas, o modelo socioeconômico dos países emergentes e o modo como a copeira desajeitadamente limpava o scanner ao lado de sua mesa.

Saiu comprimindo os pulmões, com passos largos e apressados até o carro. Caminhava olhando seus pés, como se cobrasse das pernas mais agilidade. Enquanto odiava tudo aquilo, não viu a garotinha que brincava de pisar nas cores certas da calçada, que fingia atravessar um lago, num mundo dela, com cores próprias, sons próprios, luzes próprias. Esbarraram.

Os pulmões explodiram, ele gritou, a vibração das cordas vocais instintivamente lhe incitava um prazer quase animalesco. Gritou com tudo que odiava, com o caminho que ela atrapalhou, com a insatisfação de seus passos fadigados.

Não houve resposta, com os olhos projetados para o horizonte ela retomava seu caminho, deu dois passos para o lado, como se desviasse de uma grande pedra.

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"Não me venha com mais infância"

De todas as infâncias aqui vividas, aqui postadas, aqui lembradas, eu não quero mais lembranças de uma infância. Seja sempre criança, não me venha com infância, infância é coisa de quem já envelheceu. Envelhecer é coisa de coração que vai morrer. Não me fale de infância, aqui somos eternamente esses olhos encantados.